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Poeta catarinense
com dedos podres
e mania de flâneur

Autor de "Cá Entre Nós -
Odes de Alusão e Ilusão"

CRUA

C R U A 
ou 
MANIFESTO INDIGESTO 
ou 
SÓ A ANTROPOFAGIA 
ou 
EM VOSSOS OLHOS 
ou 
CARNE VIVA 
ou 
PARA O BANQUETE 




O caro Oswald já diria: só a antropofagia nos une.
Socialmente. Economicamente. 
Filosoficamente. O artista é um antropofágico por natureza.
Um selvagem. E que prefere a carne quando crua. 
Não o alimente, não cedeis à tentação de nutri-lo: 
ele vai consumir-vos por inteiro. 
Não aproximais em demasia de suas jaulas. É perigoso. 
Ele poderia agarrar-vos por entre as grades. 
Ele poderia se quisesse cuspir peçonha em vossos olhos. 
O artista é bestial. Ele vos vê como matéria-prima, 
e nada mais. Ele vos enxerga num contexto ritual. 
Ele vos vê como algo que se pode picar, cortar, 
desmembrar, esfacelar, engolir. 
Não diga que não vos avisei: o artista é cheio de perfídias.
Constrói teias e habita tocas rasteiras em ravinas profundas.
Se um dia vierdes a cruzar com um deles em seu habitat natural, 
peço para que mantende a calma. 
Histeria é algo que os atrai de longe. 
O mais seguro a se fazer é fingir-se de morto, 
pois gostam mesmo é da carne viva. 
Em hipótese alguma direcioneis o olhar a eles. 
Segurai a respiração. 
Se conseguirdes, haverão de passar reto, 
em absoluto desinteresse por vós. 
Vivereis incólumes o restante de vossos dias, 
reconfortados em vossa modorra, 
a reclamar do tempo, do sal, do sexo, da monotonia de tudo. 
Mas se não conseguirdes, prepara então a vossa carne
e a vossa alma para o banquete. 
E entregai-vos, que toda entrega é doce.