Quem é você?
As palavras são roupas que vestimos ou tiramos?
A nudez da alma tem algo de obsceno?
E a inspiração, o que é?
Costuma pensar através de símbolos e metáforas?
Já imaginou a possibilidade de um imenso cataclismo?
Nesse caso, o que é que salvarias dos escombros do mundo,
tua força ou a tua inteligência? Tua cultura ou tua liberdade?
Gostaria de ter vivido numa outra época? Qual?
Como é que descreveria algo que grita?
Acha que o amor de hoje é mais antigo que o de ontem?
Ou é mais novo?
Percebe como dramatizo os trincos das portas?
E em como exteriorizo o interior das coisas?
Notou o ritmo capcioso desta entrevista?
Diz-me, qual tragédia grega tu serias?
Que animal gostaria de ser daqui para a frente?
Você rói unhas? Fuma demais? É contra o fumo?
Sente que a noção do tempo é convencionada?
E que as coincidências têm algum significado?
Acreditaria se eu dissesse que já sei a tua resposta?
Notou que só falo sobre rios e corredeiras?
Sabia que me pagam para enxugar as frases dos outros?
Pergunto-me-lhe: será que basta ser constante nesta altura da vida?
Será que nesse momento em algum lugar alguém se pergunta o mesmo?
Enxerga bem no escuro? Costuma bancar o Sartre?
Escreve cartas?
Acha que estou fazendo perguntas demais?
A loucura dos outros mais te assusta ou mais te atrai?
E a inexatidão nos outros?
Concorda que a subida por vezes só começa no topo do monte?
E que só em silêncio é que se compreende o vigor de uma dança?
E que a solidão tem algo de inerente à natureza do homem?
Que você poderia me perder? Que eu poderia te perder?
E que o passado talvez fosse uma impressão?
Será que no fundo a boa razão é mesmo uma coisa boa?
Percebe que sei mais de ti pelo que deixas de responder?
E que mostro mais de mim por aquilo que me esqueço de perguntar?
Qual é a lembrança mais antiga de nós dois?
Nus, a cortar águas, à beira do Douro? Uns riscos de dourado no azul?
Ou o agora?
As palavras apertam-te a cintura? O pescoço?
O sexo? A imaginação?
As palavras agarram-te pelos cabelos?